OPINIÃO

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​O touchscreen e o toque da pele

Por Leonardo Torres, palestrante e professor

| Edição de 05 de dezembro de 2018 | Atualizado em 25 de janeiro de 2022

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Vivemos numa sociedade que valoriza o “touch” ao invés do “toque”. Chegou o momento, ou até passamos dele, de questionar a nossa relação com os aparelhos eletrônicos (celulares, tablets, etc.). Será que eles não estão sendo utilizados de tal forma que estão prejudicando a própria interação entre nós, seres humanos?

O sucesso das redes sociais é evidente. Recentemente, o Facebook ultrapassou o número de 1 bilhão de usuários. O WhatsApp foi um dos principais motores para as decisões das eleições brasileiras. Temos redes sociais focadas em fotos, vídeos, namoros, etc.
Mary Meeker, estudiosa do consumo da internet no mundo, aponta que um ser humano comum passa cerca de 7 horas de seu dia diante das telas eletrônicas. Não é incomum, hoje, uma pessoa conferir as novidades de suas redes sociais ao acordar, para saber os comentários, as curtidas ou os compartilhamentos que recebeu na noite passada. Muito menos incomum é a vontade da nova geração de ser um youtuber. Estamos cada vez mais tentando interagir, seja no âmbito pessoal ou profissional, pelas redes sociais. Novamente, o Whatsapp é um desses exemplos. Estamos trabalhando mais, em horários adversos, graças a esse aplicativo. A máxima de algumas das grandes empresas de “trabalhe a hora que você quiser” significa, na verdade, que você vai trabalhar toda hora.
Se passamos horas na frente das telas, deixamos de viver horas de interação direta. Como fica o “toque” nesse contexto? Como fica o abraço, o beijo, o perfume que o outro passou, o cheiro da pele, o olhar os olhos, o beijo, o sentir a presença do outro, o sentir a pele do outro, a empatia, a alteridade? Ficam desprezados. Estamos vivendo um profundo isolamento do “toque”, promovido pelo “touch”. Ou melhor, estamos trocando o corpo, todas as sensações e emoções que ele nos proporciona, pelos conteúdos das redes sociais. Por exemplo: no Japão, 500 mil pessoas, entre 15 a 39 anos, têm se isolado por meses em casa. O caso é denominado pelo país de Hikikomoris. Além desse caso, a American Urological Association, em Boston, investigou a relação entre o consumo de pornografia e a disfunção sexual de homens, entre 20 e 40 anos. Joseph Alukal, um dos líderes da pesquisa, afirma que quanto mais os homens têm assistido pornografia, menos eles se interessam pela interação sexual real. 
E ainda em nosso cotidiano, o “toque” além de menosprezado, é violentado. Diariamente, nos transportes públicos, temos que tocar um outro desconhecido, sentir seu cheiro, tocá-lo, ser empurrado e, por vezes, até empurrar o próximo. Casos de assédios são ainda mais radicais e inaceitáveis. Além dos transportes, os vizinhos, a comunidade, de grandes cidades como São Paulo, são cada vez mais raras. Já as praças, principais centros de interação social, estão cada vez mais escassas e destruídas. As revitalizadas possuem a maravilha do WI-FI. No fim, depois de horas no transporte, de falta de espaço para interação social na cidade, nós não conseguimos e nem queremos mais tocar ninguém ou ser tocado. Fugimos para as redes sociais digitais, novamente. 
O fato é que nosso tempo é limitado. Se estamos no “touch”, não estamos no “toque”, e vice-versa. É necessário haver o equilíbrio dos dois. Devemos, então, desligar um pouco os aparelhos e olhar com mais calma para nossos vínculos e para os nossos corpos. Somente assim, as risadas de doer a barriga vindas das experiências inigualáveis com os amigos nos tempos livres, e a comunicação mais complexa da humanidade, o amor e o fazer amor, estarão a salvos.