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Bebês arco-íris: já ouviu falar?

Fernanda Neme

| Edição de 10 de maio de 2019 | Atualizado em 09 de maio de 2019

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Ainda não é muito falado, mas os bebês arco-íris são crianças que nascem de uma mãe que sofreu anteriormente um aborto espontâneo ou que teve um filho morto prematuramente. E, assim como um arco-íris, significam uma luz colorida de esperança após uma cinzenta tempestade. 

Quem passou por essa situação foi a auxiliar administrativa Bianca Borges Real, 28 anos, de Arapongas, em 2015, quando descobriu uma gravidez não planejada. Apesar de não estar esperando, o filho Léo foi sempre aguardado por ela  e pelo marido Vinícius Real, com amor e ansiedade. “Ocorreu tudo bem nos exames e ultrassons. Tive uma gestação muito tranquila”, recorda. 

Porém, no dia 28 de junho 2016, data em que Léo nasceu, Bianca conta que o filho não conseguiu mamar e quase não chorava. “Neste mesmo dia, a equipe do hospital levou meu filho para a incubadora e após alguns exames o diagnosticaram com uma cardiopatia congênita. O meu mundo desabou. Parecia que eu estava no céu e de repente, tivesse caído em um buraco”, lamenta.

Ainda se recuperando da cesárea, Bianca ficou aguardando notícias do filho, que teve que passar por uma cirurgia, a qual não resistiu. “Recebemos a notícia de que ele havia virado um anjinho. Foi e ainda é muito difícil passar pelo luto de perder um filho. Quando se perde um filho, você já quer outro. Você está preparada para ser mãe, e os familiares estão preparados para ser pai, avô, avó, bisa. Tem um quarto pronto esperando, um peito cheio de leite e você volta para casa com os braços vazios, além de você também estar vazia”, reforça. 

Logo após a perda de Léo, Bianca procurou um médico de confiança em outra cidade e ele pediu para que ela esperasse 9 meses para engravidar novamente. Vinte dias após o período, a auxiliar administrativa estava grávida. “ Gravidez do Bento, hoje com 2 anos, gerou um renascimento. Eu estou no segundo bebê arco-íris, e o Benjamin nasce em agosto. Eles são tudo para mim”, completa. Para compartilhar sua história, Bianca criou o Instagram “Depois da Perda”. 

A história da psicóloga Grasiela Rossetti, 38 anos, começou em 2011, quando descobriu que tinha endometriose, na época a doença não era muita falada e ainda desconhecida para ela. “Casei com o Rafael em fevereiro de 2011 e no ano seguinte, procurei um ginecologista em Maringá, pois eu e meu marido sempre tivemos em mente que queríamos ser pais”, conta. 

Grasiela passou por uma videolaparoscopia, que constatou que ainda tinha endometriose. Ainda não satisfeita, a psicóloga procurou outro especialista em endometriose, que disse que eu teria que passar por uma cirurgia. “Fiquei com receio e não fiz. Procurei um outro médico em Londrina, que marcou outra cirurgia, que durou cerca de 10 horas, e minha história começou a mudar em 2013”. 

No ano seguinte, Grasiela engravidou, mas sem esperar. “Ficamos muito felizes devido a toda a angústia que passamos. Só conseguíamos pensar que havia chegado a nossa hora. Foram sete semanas de muita alegria. Porém, ao fazer um ultrassom, o bebê não tinha batimento cardíaco e tive um aborto. Tive que ir direto para o centro cirúrgico para fazer curetagem. Foi um vazio terrível”, recorda. 

Desde então, Grasiela conta que foram diversas tentativas, fertilização ‘in vitro’ frustradas, desgaste psicológico e financeiro. “Quando chegou março de 2018, implantamos um único embrião e depois de 15 dias fiz o exame e estava grávida. Ainda ficamos com receio, porém, desta vez veio o nosso milagre, a Maria Vitória, que completa um aninho em outubro, nosso bebê arco-íris”, comemora. 

Lidando com a perda 

Para a psicóloga Renata Garcia, de Apucarana, na gravidez a mulher não só gesta um bebê, mas sim emoções, planos e pensamentos acerca da nova realidade. Ela vai vendo seu corpo mudar e com a morte do feto, há grande impacto das mais diversas ordens, como fisicamente, já que seu corpo se transformava pela condição de gestar uma criança e repentinamente passa a ser um corpo normal novamente. 

Além disso, a psicóloga cita o papel social, pois após a perda, há a tendência de dúvida sobre sua condição, já que não é mais uma mulher que nunca teve um filho, no entanto, não está em seu papel de mãe pois seu bebê morreu antes de nascer. 

“Quando os pais planejaram e esperavam com carinho por esse filho que se foi, comumente pode existir um processo de luto semelhante ao sentido quando perdemos alguém amado, como a mãe, um irmão ou até mesmo outro filho. E desta forma, deve-se acolher e respeitar este momento, já que cada pessoa sente a seu próprio modo”, explica. 

Renata diz que muitos destes casais não são acolhidos e compreendidos pela sociedade, e às vezes, até mesmo por alguns profissionais da saúde, o que nos mostra que a perda gestacional não é recebida com a empatia e cuidado que merece. “Uma grande ferramenta neste momento é buscar grupos de apoio e rodas de conversa para auxiliar no luto e elaborá-lo, compreendendo que muitas vezes a ajuda externa será boa para a superação e na transformação da dor em motivação. 

Respeitando seu tempo para aprender a lidar com a dor e o luto que esta experiência lhe trouxe”, acrescenta.Após um trauma como o de perder um filho repentinamente, segundo a psicóloga, é comum colocar-se sob tensão de viver mais uma vez a mesma coisa. 

Ansiedade, medo e insegurança misturada com amor, alegria e esperança. Um misto por vezes recebido com confusão por parte dos pais. “Porém, um ponto que merece destaque é que nenhum filho substitui o outro. E desta forma, aquela criança que não sobreviveu e não teve a possibilidade de ter sua história vivida, também é filho e naturalmente sua existência, mesmo que pequena, deve ser incluída à dinâmica e à história da família”, explica. 

Na opinião de Renata, é importante para a nova criança ser vista como única e não como extensão da primeira que morreu. “Quando um novo bebê chega, após um luto mal elaborado, há certa tendência à superproteção por parte dos pais, o que pode impedir um desenvolvimento saudável, bem como a autonomia da criança”, explica. 

A psicóloga reforça que os pais devem direcionar o afeto e a educação a criança sem excessos de qualquer ordem. “Excessos estes que podem estar ligados aos medos de reviver o que passou e ansiedades com o intuito de controlar para que nada de mal ocorra”, complementa. Outro ponto a ser olhado, é sobre a tristeza ao relacionar o filho vivo com o filho perdido. 

“Cada filho é único e precisa ser visto como tal. Se confusões e luto mal elaborado forem vivenciados por parte dos pais é imprescindível buscar auxilio psicológico. Neste espaço receberá acolhimento necessário bem como a possibilidade de compreender e superar essas experiências”, reforça.

Fotos: Emanuelli Kuxinerika, arquivo pessoal e Delair Garcia