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Eles não estão na lista da Odebrecht

Fernanda Neme

| Edição de 23 de abril de 2017 | Atualizado em 25 de janeiro de 2022

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Alguns apelidos da lista de propina da Odebrecht chamaram atenção nos últimos dias nos noticiários do Brasil. “Aspirina”, “Bico”, “Boca Mole”, “Todo Feio”, entre outros, fazem parte da relação de codinomes que ganharam destaque no noticiário. O apelido, aliás, é uma tradição brasileira.

Entre famosos, os apelidos são marca registrada e fazem parte do patrimônio do artista. Exemplos não faltam: Pelé, Baby Consuelo – depois Baby do Brasil, Tiririca, entre tantos. O apelido, por vezes, vira nome. A apresentadora Xuxa, o ex-presidente Lula, por exemplo, incorporaram legalmente o apelido junto ao registro.
É quase impossível não ter um amigo ou pelo menos um conhecido que é chamado mais pelo apelido, que pelo nome. Por exemplo, você já ouviu falar do Berimbau, radialista e redator do Blog do Berimbau, de Borrazópolis? Provavelmente, sim! Mas, você conhece o Ronaldo Alves Senes? É a mesma pessoa, só que o apelido prevaleceu.
O radialista, hoje com 45 anos, conta que ganhou o apelido quando começou a fazer reportagem para o Pinga Fogo, que também era mais conhecido pelo codinome do que pelo nome. “Como eu era muito barulhento, ele me comparou com um berimbau, instrumento baiano”, explica.
Ele conta que ficou meio incomodado e em alguns momentos tentou abandonar o apelido, mas não teve jeito. “Na região é tranquilo, todos me conhecem assim, mas quando vou ligar para alguém em outro estado e digo que sou o “Berimbau”, os risos são inevitáveis. Hoje, este apelido é algo impossível de abandonar”, ressalta.
Para Berimbau, o apelido tem um ponto negativo. “Ele nos rouba a identidade, pois passamos a ser conhecidos apenas por ele e não pelo nome que leva a história de nossa família. Acredito que esse é o motivo do uso dele em casos como de corrupção, ou seja, a ideia é que a identidade verdadeira do autor não seja conhecida”, reforça.
Outro radialista que também é muito conhecido pelo apelido é o repórter Cibalena, 69 anos, de Arapongas. O nome de cartório Luiz Francisco da Rocha, permaneceu até os anos 1970. A origem do apelido, conta ele, veio de uma briga. “Eu trabalhava em uma farmácia e o teto do lugar caiu, tivemos que levar todos os remédios para outra drogaria. No caminho, eu estava com uma cesta de remédios para dor de cabeça Cibalena, e encontrei um amigo, que me disse que iria chutar a cesta. Eu falei: se você chutar a gente vai sair rolando aqui na rua. Ele chutou e começamos a brigar ali mesmo”, recorda.
No mesmo dia da confusão, Cibalena foi ao cinema com amigos e encontrou o rapaz com quem havia brigado. “No meio da sessão, ele gritou: Luizinho Cibalena. Eu disse: É sua mãe e mais alguns palavrões”, recorda o radialista, que acabou expulso da sessão.
“Depois disso o apelido ficou e até hoje sou mais conhecido como Ciba ou Cibalena. Nunca liguei”, conta.

Codinomes ‘nascem’ no período escolar
Condições físicas e período escolar. Essa combinação de fatores está por trás de muitos apelidos. Foi na escola que Márcio José de Almeida, 38 anos, ganhou o codinome de Raspinha. Hoje, nem nas redes sociais ele assina mais o nome de batismo. Quem entrar no Facebook do apucaranense, que trabalha no setor de arquivo da Câmara Municipal de Apucarana, vai encontrá-lo como Raspinha Almeida. Há mais de 25 anos, ele resolveu assumir o apelido, que surgiu quando ainda estava na escola.
Na época, entretanto, ele não gostava nada do codinome – reação que parece ser a ‘receita’ para um apelido ‘pegar’. “Eu tinha 12 anos e nesta época meus dentes iam muito para frente e eu também usava aparelho, o que chamava mais a atenção. Uma marca de raspinha (aquelas de sorte) surgiu com um coelho como símbolo da propaganda, e desde então surgiu o ‘Raspinha’. Fiquei triste um tempo, mas depois assumi, virou marca registrada”, recorda.
A marca registrada de João Baptista Domingos Júnior, o Pig ou professor Pig, 36 anos, é o apelido, que vem desde a 5ª série. O apucaranense conta que o apelido surgiu durante uma aula de História, em que o professor falava sobre uma tribo indígena em que os integrantes tinham no máximo um metro e meio.
“Como sempre fui o menor da turma, alguns alunos me chamaram de pigmeu. De pigmeu, ficou apenas Pig. Ao contrário de muitas pessoas que recebem apelidos, eu não fiquei incomodado com o codinome. Eu gosto desse apelido. Nunca tive problemas com isso”, garante.
Aos 48 anos, o professor de Educação Física e treinador de Atletismo, José Marcelino da Silva, também ganhou o apelido ainda na infância e hoje é mais conhecido como Grillo, do que pelo nome registrado no cartório. “Eu ganhei o apelido porque eu era magrinho”, recorda. Grillo conta que no começo ficava irritado, mas depois se acostumou. “Hoje sou mais conhecido pelo meu apelido, do que pelo meu nome verdadeiro”, conta.

Brincadeira pode gerar desconforto
O que parece uma brincadeira pode se transformar em um problema psicológico, principalmente na infância e adolescência. Segundo a psicóloga Rayssa Nogueira, de Apucarana, os apelidos são como marketing pessoal, porém, não são a identidade de quem recebe e sim uma parte desta pessoa.
“Quando a pessoa que recebe o apelido não sabe como reagir frente a esta situação, por não gostar ou discordar, isto pode afetar seu psicológico e até sofrer bullying”, explica. Nestes casos, Rayssa diz que o indicado é conversar com familiares, amigos ou professores (quando acontece no ambiente escolar) e explicar o que sente e porque não gostou.
“Ignorar o apelido é uma alternativa para que ele seja esquecido com o tempo. O apelido não é necessariamente o que somos, por isso, devemos respeitar os sentimentos e limites do próximo”, ressalta.